As novas Diretrizes da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil, recentemente aprovadas pela Assembleia da CNBB, partem da necessidade urgente, apresentada na V Conferência Latino-americana e Caribenha, a de uma Igreja em estado permanente de missão. Fazem dela a primeira de suas cinco urgências, a base central e o eixo de referência para as outras quatro.
Que significa isso, uma Igreja em estado permanente de missão?
Primeiro, que a Igreja é, por sua natureza, missionária. Os quatro Evangelhos mostram isso muito claramente. Todos eles lembram o mandato missionário deixado por Jesus.
Em Mateus, Jesus diz: “Foi-me dada toda autoridade no céu e na terra. Ide, pois, fazer discípulos entre todas as nações, e batizai-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Ensinai-lhes a observar tudo o que vos tenho ordenado ” (Mt 28, 18-20).
Em Marcos, Jesus diz assim: “Ide pelo mundo inteiro e anunciai a Boa Nova a toda criatura! Quem crer e for batizado será salvo. Quem não crer será condenado” (Mc 16, 15-16).
Em Lucas, na aparição como peregrino aos discípulos de Emaús, Jesus fala: “ ... o Cristo sofrerá e ressuscitará... e no seu nome será anunciada a conversão, para o perdão dos pecados, a todas as nações, começando por Jerusalém” (Lc 24, 46-47).
Em João, Jesus aparece aos apóstolos, junto ao lago, onde haviam passado a noite sem pescar nada, e pede-lhes para lançar as redes. Então apanharam grande quantidade de peixes. Em seguida, dialogando com Pedro, explicita a missão significada pela pesca e sua necessária condição: “Tu me amas? ... Tu me amas?... Tu és meu amigo? Então cuida dos meus cordeiros... apascenta minhas ovelhas” (Jo 21, 4-17).
Se a Igreja possui, como visto, uma constituição missionária, então é necessário que ela o seja de fato, que exerça continuamente essa sua missionariedade. Aqui, nesta acepção, Igreja em estado permanente de missão significa Igreja em exercício permanente de missão. È nisso sobremaneira que as novas diretrizes insistem, oferecendo fundamentação para formar uma consciência missionária e pistas de ação.
E qual é a relação das Comunidades Eclesiais de Base com essa Igreja em exercício permanente de missão?
Uma Igreja em exercício permanente de missão exige estruturas missionárias, uma organização missionária. Ora, as atuais estruturas da Igreja são preponderantemente de conservação, não de missão. Em vez de ir ao encontro das pessoas, visitá-las indistintamente, criar relacionamentos de amizade e mútua ajuda, proporcionar-lhes momentos de encontro com Cristo, de escuta da Palavra de Deus, de reflexão e oração, a Igreja permanece recolhida ou encolhida em seus domínios, esperando que as pessoas rompam seu isolamento, venham até ela e busquem seus serviços.
Nas CEBs ou Grupos Eclesiais que para elas caminham, há um novo estilo de Igreja, o estilo das origens, o das primitivas comunidades cristãs. É a volta às fontes. Após a ressurreição de Jesus, seus discípulos começaram a se reunir nas casas, sob a liderança dos apóstolos e seus colaboradores. Ali iniciou-se um processo de formação, tomando como modelo o próprio Jesus, seu jeito de se relacionar com o Pai, de ouvir sua Palavra, ir ao encontro das pessoas, dialogar e buscar solidariamente soluções para os problemas da vida.
Ali, nesses encontros de base, construía-se a Igreja. Seus pilares eram a Palavra de Deus, a comunhão e partilha fraternas, a oração e a fração do pão (eucaristia). Neles participavam adultos, jovens, homens e mulheres, idosos e crianças. Tudo na simplicidade e alegria, próprias das pessoas de fé. Do jeito como se diz num provérbio africano: “Gente pequena, em muitos lugares pequenos, fazendo coisas pequenas, mudam a face da terra.”
Essa antiga novidade começou a ser retomada oficialmente pelo Concílio Vaticano II, o grande marco de renovação da Igreja, colocado há cinquenta anos. Foi na esteira desse Concílio e dos movimentos que o provocaram, entre eles o do Mundo Melhor, que nasceram as CEBs. Isso aconteceu no Brasil, ao redor dos anos sessenta. Em 1964, o episcopado brasileiro assumiu esse projeto, que em seguida se difundiu para a Igreja toda.
Convém historiar um pouco. Entre os anos 1967-1970, o Grupo Promotor do Mundo Melhor, primeiro na Argentina, depois na sede internacional de Roma, continuando a propor as CEBs, colocava-se uma série de perguntas à luz das experiências em ato: quais e quantos membros devem compor as CEBs? Como entendê-las e distingui-las dos outros grupos existentes? As CEBs são tais desde o início ou devem cumprir um itinerário de educação à fé? Neste caso, qual? Devem elas ser promovidas uma a uma ou todas ao mesmo tempo? Como acompanhá-las e coordená-las entre si? Que fazer com o resto dos batizados que delas não participam? Como evangelizar o povo enquanto tal? As respostas a essas e outras perguntas, com elas a consciência da imprescindibilidade de uma pastoral de conjunto, fizeram intuir a necessidade de uma nova imagem de paróquia, entendida então como comunhão de comunidades, em Aparecida denominada comunidade de comunidades.
Se as cinco urgências apresentadas nas novas diretrizes, Igreja, estado permanente de missão, Igreja, casa da iniciação à vida cristã, Igreja, lugar de animação da vida e da pastoral, Igreja, comunidade de comunidades e Igreja a serviço da vida plena para todos, podem e devem perpassar todas as pastorais, os serviços, movimentos e grupos da Igreja, elas se realizam, de um modo muito particular, nas Comunidades Eclesiais de Base.
As CEBs e os Grupos Eclesiais em vias de se tornarem CEBs são, dessa forma, as células primárias, os núcleos básicos de estruturação da Igreja em estado permanente de missão.
* Bispo Referencial das CEBs no Regional
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